sexta-feira, julho 21, 2006

Passagem *

Andavam pela praia de Botafogo ao meio-dia e mal sabiam o que estavam fazendo ali. A única certeza que havia é a de que estavam lá e que ali sim era o lugar
onde gostariam de estar. Era um meio do dia de inverno carioca, em que o quente se faz gostoso e o frio dá suas pitadas apenas para lembrar que existe nessa época.

Um dia amantes, outro amigos. Nada mais (in)definido do que isso. A verdade é que se gostavam como irmãos e só o fato de terem se achado já lhes causava conforto e vontade de viver.

Tarefa nem sempre fácil essa de viver. Muito mais é a de se ter vontade. Vontade é o que move e o que resta de quando e como se move. A questão é, então, se mover.

Falavam de tudo. Das pessoas, da Arte, do Amor e da Felicidade. Talvez ela soubesse melhor definir um padrão de felicidade. Mas nunca conseguiria explicar isso a ele, pelo simples motivo de não ser ele. Ele, com certeza, sabia do padrão de felicidade. Dele.

Talvez o pavor típico de quem tenta se encontrar não os consumisse tanto. Talvez o pavor de toda uma avalanche de transformação não o consumisse como consumia a moça de vinte e um anos.

- Será que um dia eu vou conseguir tudo o que quero? Será que algum dia eu vou ser feliz do jeito que imagino a felicidade?

- Claro que vai, querida. Por que você está pensando nisso agora?

- Por que eu tenho medo que isso não aconteça.

Veja bem: um medo de alguma coisa que nunca aconteceu. Medo de algo que talvez nunca aconteça. Essa era ela, com o pé no mundo adulto. Entrada essa que lhe trazia calma e ansiedade, força e medo, tristeza e felicidade, graça e aborrecimento. Parecia meio chato as coisas tão, assim, preto no branco. Mas era real.

O que é real? Conversavam que talvez o real nem existisse. E só o que havia era sonho, sentimento e vontade. Ah, isso sim dava combustível e força para a vida. Poder sonhar?! Nada mais estimulante!

De qualquer forma, sonhar não os levava a lugar algum. Relativamente... Era como se o mundo passasse sob seus olhos, cheio de panorâmicas, travellings e luz fotometrada. Pura ilusão. Ou pura felicidade.

- O que a gente faz com tudo isso que sente? Por que é tão confuso tudo o que passa pela nossa cabeça?

- Nossa, você parece confusa! O que anda te afligindo, me conta.

- Nada. Acho que é o nada que me aflige.

A possibilidade de tudo é praticamente um nada. Ela estava aprendendo a não ser mais isso. Ela queria ser tudo. E para ser tudo você, inevitavelmente, acaba se prendendo a nada. Era preciso que acreditassem nela! Era necessário que ela acreditasse nela! Da forma mais sincera e absoluta possível.

Depois tudo começaria. Horas iguais e sempre diferentes. Dias diferentes e processos semelhantes. O que vale então é a lição que se tira disso. É como se leva o processo... o mover.

Sem que ninguém saiba e para que o mundo ouça:
não há explicação, só certeza interior.

* Texto por Marsílea Gombata.